O (Des)gosto

O sol mostrava seu brilho como nunca através das janelas. Se prostrou frente à escrivaninha, e viu que os papéis respingados de café ainda estavam lá. Sujos de café e limpos de palavras. Apenas papéis e respingos. Nada de letras, palavras, sintaxes, paráfrases. Nada. Nenhuma de suas anotações estavam lá.
O não e o sim continuavam a vagar por sua cabeça, quando subitamente, dominado por um ímpeto violento, transbordado, jogou a xícara cheia de café contra a parede, como que para descontar . O barulho da xícara quebrando deu-lhe um imenso prazer. Olhou todos aqueles cacos no chão, amassou todos os papéis em cima da mesa. Com as mãos apertando a cabeça como se dela fosse sair algo, passou as mãos pelo rosto e correu para o espelho. Ficou por minutos ali, encarando a si mesmo em silêncio. Abriu a torneira e molhou as mãos. Molhou o rosto também. Secou-se. Não havia nenhum respingo.
Depois de acalmar-se e organizar os monstros, voltou à escrivaninha, sentou-se, pegou um lápis, um papel e começou a escrever desesperadamente, apaixonadamente, sufocadamente. O reflexo do sol batia nos cacos de vidro e Ella sussurrava baixinho: 'I walk the floor and watch the door, and in between I drink, black coffee...'. Os cacos continuaram lá, e em seus pensamentos: "nunca acertei tanto, tanto em acabar brutalmente com um desgosto".

Nenhum comentário:

Postar um comentário